Matéria de Andrew Jacobs, no New York Times, diz que o
congresso brasileiro é um CIRCO que tem seu próprio palhaço.
Com certeza o jornalista, autor da matéria, nunca assistiu uma sessão do GRANDE CIRCO
da trupe dos vereadores de Ceará-Mirim.

Leia a matéria

Envolvido em corrupção, Congresso brasileiro é
circo que tem até seu próprio palhaço
 
The New Yor Times

Por Andrew
Jacobs – Em
Brasília

Um dos espetáculos há mais tempo em exibição
no Brasil conta com um número desconcertante de personagens cuja teatralidade
aparece em milhões de televisores quase toda noite.

O elenco em constante mudança de 594 integrantes e inclui suspeitos de
homicídio e tráfico de drogas, ex-jogadores de futebol, um campeão de judô, um
astro sertanejo e uma coleção de homens barbados que adotaram papéis como
líderes do movimento das mulheres.

O elenco até mesmo inclui um palhaço cujo nome significa “Zangado”.

Mas eles não são atores. Eles são os homens e mulheres que servem no Congresso
nacional.

A democracia pode causar perplexidade e confusão, mas no mundo há pouco que se
iguala ao Congresso brasileiro.

Enquanto a nação enfrenta sua pior crise política em uma geração, os
legisladores que orquestraram a remoção da presidente Dilma Rousseff (que foi
suspensa na quinta-feira (17/05) e enfrenta um processo de impeachment sob acusação de
manipulação do orçamento) estão sob novo escrutínio.

Mais da metade dos membros do Congresso enfrenta processos na Justiça, de casos
envolvendo auditoria de contratos públicos até crimes sérios como sequestro ou
homicídio, segundo o Transparência Brasil, um grupo que monitora a corrupção.

As figuras sob investigação incluem o presidente do Senado e o novo presidente
da Câmara. Neste mês, o presidente anterior da Câmara, um comentarista de rádio
evangélica que gosta de postar versos bíblicos no Twitter, foi afastado para
ser julgado pela acusação de esconder até US$ 40 milhões em propinas em contas
bancárias na Suíça.

Muitos dos problemas do Legislativo derivam das generosas recompensas
proporcionadas pelo sistema partidário brasileiro de múltiplas cabeças como de
uma hidra, uma coleção desajeitada de dezenas de partidos políticos cujos nomes
e agendas com frequência deixam os brasileiros coçando suas cabeças.

Há o Partido da Mulher Brasileira, por exemplo, um grupo cujos membros eleitos
no Congresso são todos homens.

“O processo eleitoral permite muitas distorções”, disse Suêd Haidar,
a fundadora e presidente do partido. Ela suspirou, reconhecendo que muitos dos
homens que ingressam têm pouco interesse em promover os direitos da mulher.

Um dos que se juntaram ao partido, o senador Hélio José da Silva Lima, foi
acusado de abusar sexualmente de uma sobrinha menor de idade no ano passado,
apesar das acusações terem sido posteriormente retiradas. “O que seria de
nós, homens, se não fosse uma mulher ao nosso lado para nos trazer alegria e
prazer?” ele foi citado como tendo dito à imprensa brasileira, quando
perguntado sobre sua decisão de ingressar no partido das mulheres.

A mesma fúria pública com a corrupção endêmica e má gestão governamental que
ajudou a retirar Dilma Rousseff do poder há muito é direcionado à cabala de
políticos, a maioria homens brancos, cuja inclinação por acordos escusos e
enriquecimento próprio já faz parte do folclore brasileiro.

A reputação da classe política no Brasil realmente não tem como
piorar
“, disse Timothy J. Power, um professor de estudos brasileiros da
Universidade de Oxford.


“As pessoas comparam o Legislativo à ‘House of Cards'”, ele disse,
referindo-se à série política da Netflix, “mas eu discordo. ‘House of
Cards’ é, na verdade, muito mais crível”.

Com 28 partidos ocupando cadeiras, o Congresso brasileiro é o mais dividido do
mundo, segundo Power. O que fica em segundo lugar, o da Indonésia, tem um terço
a menos de partidos.

“O Brasil não é atípico, é uma aberração”, disse Gregory Michener,
diretor do programa de transparência pública da Fundação Getúlio Vargas, uma
universidade no Rio de Janeiro.

Pesquisas mostram que mais de 70% dos brasileiros não conseguem se recordar a
qual partido os candidatos que elegeram pertencem, e que dois terços do
eleitorado não têm preferência por qualquer partido.

Mais importante, dizem os especialistas, é que a maioria dos partidos não
abraça nenhuma ideologia ou agenda, e são simplesmente veículos para
clientelismo e propina. Em um mandato típico de quatro anos, um entre três
legisladores federais trocará de partido, alguns mais de uma vez, segundo um
levantamento por Marcus André Melo, um cientista político da Universidade
Federal de Pernambuco.

Os legisladores brasileiros estão entre aqueles com remuneração mais alta do
mundo, dizem estudiosos, com quantias que vão além do salário mensal. Eles
também recebem moradia e atendimento de saúde gratuitos, verbas para um grande
número de funcionários de gabinete e foro privilegiado em caso de processos.
Apenas o sobrecarregado Supremo Tribunal Federal pode julgá-los em processos criminais,
algo que pode levar anos.

“A única coisa melhor do que ser um partido político no Brasil é ser uma
igreja”, disse Heni Ozi Cukier, um cientista política da Escola Superior
de Propaganda e Marketing, em São Paulo. “São oportunistas à procura de algo
que lhes dê poder, influência e proteção.”

Formar um partido requer a coleta de 500 mil assinaturas. Cukier disse que 62
partidos estão à procura de reconhecimento oficial, inclusive um que leva o
nome de um time de futebol.

Apesar do presidente do Brasil liderar um dos maiores países do mundo, ele ou
ela deve formar coalizões com até uma dúzia de partidos para conseguir que
legislações sejam aprovadas no Congresso. O preço da lealdade com frequência é
uma cadeira de ministro, ou três, dependendo de quantos votos o partido puder
oferecer.

Em alguns casos, a cooperação envolve a troca ilícita de dinheiro. Em 2005, um
escândalo conhecido como mensalão revelou o quanto esses arranjos eram comuns.
Para obter votos no Congresso, o partido do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, o mentor de Dilma Rousseff e porta-bandeira do Partido dos
Trabalhadores, pagava aos legisladores obedientes um valor mensal equivalente a
US$ 12 mil.

O mais recente escândalo de corrupção, conhecido como Operação Lava Jato, provou
ser ainda maior, com bilhões de dólares em propinas destinados a partidos
políticos pela companhia estatal de petróleo, a Petrobras. Mais de 200 pessoas,
de magnatas empresariais a líderes partidários, foram implicados no escândalo,
e a expectativa é de que o número deles crescerá.

O furor público com o esquema teve papel chave na remoção de Dilma Rousseff,
que foi diretora da Petrobras quando o arranjo de propina foi armado, apesar de
ela não ter sido acusada diretamente de qualquer crime. Em seu julgamento de
impeachment, ela é acusada de uma manipulação orçamentária, em um esforço para
esconder os problemas econômicos do Brasil e vencer a reeleição em 2014, não de
roubar para enriquecer a si mesma.

A necessidade de formação de alianças de conveniência no Congresso pode levar
ao caos legislativo, especialmente quando partidos descontentes abandonam a
coalizão do presidente. Dilma Rousseff, que antes contava com ampla maioria na
Câmara, acabou abatida pelo agora deposto presidente da Câmara, Eduardo Cunha,
um ex-aliado que enfrenta julgamento por corrupção.

O partido de Cunha, o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), se
tornou uma fonte particular de ultraje no Brasil. Os críticos dizem que o
partido, fundado há cinco décadas como partido de oposição, mas tolerado pela
ditadura militar do Brasil, se tornou um vasto canal de clientelismo para seus
membros, que abraçam um amplo espectro de ideologias.

O trunfo do partido é seu tamanho, o que significa que os presidentes precisam
entrar em acordo com ele, o que envolve a concessão de cargos ministeriais
cobiçados. Dilma Rousseff escolheu Michel Temer do PMDB para ser seu
vice-presidente. Neste ano, ele se voltou contra ela e retirou seu partido da
coalizão, abrindo caminho para o processo de impeachment de Dilma. Temer, que
já foi condenado por violar os limites de financiamento de campanha, agora é o
presidente do país.

A reforma política pode ser difícil, já que os legisladores teriam que aprovar
o fim do sistema que os protege. Ocorreram algumas mudanças, incluindo uma lei
recente que impede que candidatos cassados ou com condenação concorram a
qualquer cargo eletivo por até oito anos, e uma lei de financiamento de
campanha, que deverá entrar em vigor neste ano, que limita a influência de dinheiro
de empresas.

O grande número de partidos no Brasil tende a favorecer celebridades, cujo
reconhecimento do nome ajuda a fazer com que se destaquem nas campanhas
eleitorais. O exemplo mais curioso é o do palhaço Tiririca.

Em 2010, ele concorreu à Câmara dos Deputados com o slogan “Pior que tá
não fica”, e sua literatura de campanha incluía “Você sabe o que faz
um deputado federal? Eu também não. Vote em mim que eu te conto”.

Ele acabou obtendo mais de 1,3 milhão de votos, quase o dobro do segundo candidato
mais votado.

Em uma entrevista, Tiririca, cujo nome real é Francisco Everardo Oliveira
Silva, apesar de deputado Tiririca ser o nome no site da Câmara, disse ficar
com frequência decepcionado com a desordem no Congresso.

“No início era uma piada”, ele disse sobre sua candidatura.
“Então decidi que, se tantas pessoas acreditam em mim, eu teria que dar
meu melhor, e é o que estou fazendo.”

Anna Jean
Kaiser, em São Paulo, e Paula Moura, em Brasília, contribuíram com reportagem

Deixe um comentário

Copy link