A delação de Pedro Corrêa (PP) indica que empresários pagaram propina a
quem votou para mudar a Constituição em 1997
 

Por José Antonio Lima

Em
2007, durante uma sabatina promovida pelo jornal Folha de S.Paulo, o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso negou participação no
esquema de compra de votos para permitir sua reeleição, mas não negou a
existência do esquema.

“Houve compra de votos? Provavelmente. Foi feita pelo
governo federal? Não foi. Pelo PSDB: não foi. Por mim, muito menos”.

Compra de votos teria sido realizada por quem, então? A delação premiada do
ex-presidente do PP Pedro Corrêa, que integra as investigações da Operação Lava Jato e ainda não homologada pela Justiça, pode
ajudar a responder.

Na
delação, parcialmente revelada pela Folha
no sábado 25, Corrêa afirma que FHC contou com suporte financeiro de grandes
empresários para aprovar o projeto da reeleição. Entre os apoiadores do tucano
estaria, diz Corrêa, Olavo Setubal, do banco Itaú, morto em 2008.

“Olavo
Setubal dava bilhetes a parlamentares que acabavam de votar, para que se
encaminhassem a um doleiro em Brasília e recebessem propinas em dólares
americanos”, diz documento da Procuradoria-Geral da República citando o
ex-deputado, condenado no “mensalão” e também na Lava Jato. A família
controladora do banco nega as acusações de forma veemente.

O
caso é antigo, está provavelmente prescrito e portanto não deve ser
investigado. Ainda assim, é talvez o exemplo mais bem acabado de como
funcionavam as instituições sob o governo FHC.

A
reeleição foi aprovada na Câmara em janeiro de 1997 e, em maio daquele ano, a Folha revelou
que dois deputados, Ronivon Santiago e João Maia, ambos do PFL-AC, hoje DEM,
venderam seus votos por 200 mil reais.

Nas
gravações, havia provas cabais contra os dois e indícios de que dezenas de
parlamentares teriam vendido seus votos. Entre os relatos, alguns de que a
propina chegava em dinheiro vivo, o que pode ir ao encontro da versão de Pedro
Corrêa sobre os pagamentos feitos por doleiros.

Ao
contrário do que ocorre hoje em dia, aquele caso foi abafado por todas as
instâncias que poderiam investiga-lo.

No
Congresso, uma CPI pedida pela oposição foi barrada graças à atuação do PMDB.
Enquanto Ronivon Santiago e João Maia renunciavam com ofícios exatamente
iguais, entregues ao então presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB), dois
peemedebistas, Eliseu Padilha e Íris Rezende, assumiram ministérios no governo
FHC apenas nove dias após o escândalo revelado.

A
Procuradoria-Geral da República, então comandada por Geraldo Brindeiro,
apelidado de “engavetador-geral da União” e que esteve no cargo nos oito anos
de mandato tucano, arquivou as representações.

Assim
como a PGR, a Polícia Federal da era FHC não assustava ninguém, ao menos os
políticos governistas. O caso foi investigado apenas em 2001, e teve entre os
intimados Fernando Rodrigues, jornalista responsável pela reportagem. Não deu
em nada.

Se
hoje a PF se manifesta com dureza contra possíveis ingerências em seu trabalho,
nos anos 1990 a instituição não tinha força alguma. Tanto é que FHC manteve
como diretor-geral da PF um delegado filiado ao PSDB.



Agílio
Monteiro Filho, indicado pelo então deputado Pimenta da Veiga, hoje réu no
“mensalão tucano”, foi nomeado em 1999, quando Renan Calheiros (PMDB) ainda era
o ministro da Justiça, e deixou o cargo em 2002, para disputar uma vaga na
Câmara pelo PSDB, ao qual estava filiado desde 2001.

A
imprensa, que cobriu e cobre de forma extensa outras tentativas de perpetuação
no poder, mesmo envolvendo voto popular, como as de Evo Morales (Bolívia) e
Hugo Chávez (Venezuela), e estrilou com a possibilidade de Lula buscar um
terceiro mandato em 2010, tampouco foi a fundo no caso da compra de votos.

“[A
história] nunca foi bem acompanhada pela mídia em geral”, lembrou Fernando
Rodrigues em entrevista ao documentário Mercado
de Notícias
, de Jorge
Furtado
.

Em
4 de junho de 1997 a emenda da reeleição foi aprovada pelo Senado. Em 1998, FHC
foi reeleito.

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